quarta-feira, 1 de setembro de 2010

republicanices

  • Os dois últimos artigos que saíram no jornal Público sobre a República, a saber, o primeiro de Joaquim Pintassilgo com o título Analfabetismo e Educação Popular (P2 de 31 de Agosto de 2010), e o segundo de Maria Alice Samara intitulado À Espera da Nova Aurora (1 Setembro de 2010), não colocando em causa os méritos dos respectivos investigadores, e reconhecendo que nem tudo pode ser dito em duas páginas, há, contudo, dois aspectos a salientar que defraudam a tentativa de abarcar a ideia republicana. Sem pretender ser republicano, mas um simples descobridor da mentalidade republicana, podemos desbravar o seguinte: no primeiro caso, não devendo ser propriamente ignorância, diga-se assim de passagem, ao citar António Sérgio e a projecção da Escola Nova em Portugal, esqueceu-se, possivelmente, inadvertidamente, de Bernardino Machado, um dos primeiros propugnadores da nova corrente educacional. Aliás, quem nos diz isso mesmo é Rogério Fernandes, para o qual Machado tem afinidades com a respectiva escola. É impressionante como Bernardino Machado ainda continua, nos dias de hoje, pelo menos em termos pedagógicos, completamente esquecido! Salva-se o Museu, com o seu próprio nome, e tutelado pela Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, aliando-se às respectivas comemorações nacionais do centenário da República em Portugal, tem publicado as obras de Machado (coordenadas pelo Prof. Dr. Norberto Cunha e coordenador científico do mesmo museu) prevendo-se brevemente o tomo III da obra pedagógica e o tomo I da obra política, com muitas surpresas. Colocarei aqui uma breve interpretação de Rogério Fernandes sobre o pensamento pedagógico de Bernardino Machado. O segundo caso, para espanto meu, deve-se ao facto da investigadora nem sequer ter referido a Lei do Descanso Semanal, que tanta polémica deu após a sua promulgação. Em Vila Nova de Famalicão, as petições da Associação Comercial e Industrial ao governo provisorio republicano, são um caso concreto, envolvendo-se esta instituição em polémicas constantes com os patrões, ou estes exigindo o que pretendiam! E as greves começarem logo praticamente em Novembro, não foi preciso chegar a 1911, conforme a investigadora anuncia no seu texto! Salvou-me hoje, para ficar mais bem dispostinho, este livro infantil dedicado há República, publicado por uma editora famalicense, a Húmus, do sr. Rui Magalhães. Há sempre assim estas surpresas agradáveis...


  • "Considerando a instrução como o alicerce das nacionalidades, defendia o desenvolvimento do ensino oficial em ordem à defesa das instituições e ideias democráticas, à moralidade geral e ao fomento económico. O ensino popular primário seria a base do edifício, através da instruçao intelectual e da instrução manual, cujo valor formativo salientava. Os «estudos profissionais», o «ensino do trabalho» principiariam na escola primária. O «trabalho manual» manter-se-ia, de resto, no plano de estudos até ao ensino superior. O curso secundário teria de ser acompanhado de um «tirocínio oficinal» e ninguém poderia aspirar ao ingresso numa Faculdade ou Escola Superior se não fosse «mestre em alguma profissão». Entre o chamado «ensino preparatório» para a Universidade (ou «burguês») e o ensino profissional não poderia existir uma separação completa. O objectivo fundamental de Bernardino, ao advogar este sistema, radica explicitamente nso imperativos do desenvolvimento económico, ou seja, em termos de investimento. / À escola primária elementar preconizava Bernardino que se seguisse o ensino profissional, para aqueles que não ingressassem nos liceus. O ensino profissional médio e superior figuram igualmente nos seus escritos, não tendo alcançado, todavia, desenvolvimento doutrinal apreciável. Quanto ao ensino liceal, advogava que possuísse uma ampla base cultural e científica, sem cunho profissional mas voltado para a realidade. / Às Universidades atribuía uma função de vanguarda, assim no plano político como no científico e humanístico. A ligação entre as preocupações da Universidade e os problemas reais da Sociedade, identificando o estudo com o trabalho e introduzindo nas tarefas universitárias a noção de serviço, era um dos requisitos da sua modernização. / O ensino da liberdade, outra das missões universidades prescritas, pressupunha a eliminação dos métodos «catedráticos»: o ensino deveria representar um convite à autonomia espiritual, ao espírito crítico. / Outro aspecto relevante na obra de Bernardino Machado, até agora minimizado ou ignorado pelos seus críticos, é o interesse que manifestou pelas questões de pedagogia e pesicologia. As suas Notas de um Pai, a despeito de algumas páginas desprovidas de alcance teorético, representam um primeiro tentame de observação directa do comportamento psicológico da criança tal como aconselhava Claparède. É esta, aliás, uma das obras que o psicólogo suíço refere na sua Psychologie de l`Enfant." (Rogério Fernandes, O Pensamento Pedagógico em Portugal, 1978, pp. 120-121)