domingo, 27 de junho de 2010

ética e república

ÉTICA E REPÚBLICA
O CIDADÃO IDEAL




O Município de Barcelos teve a amabilidade de convidar a Associação Portuguesa de Ética e Filosofia Prática para abrir a tertúlia denominada ao tema "Ética e República". Esta acção visa as comemorações do centenário da República em Barcelos e a respectiva Associação tem o maior júblio em estar presente na abertura. O Presidente da Direcção Nacional, Dr. Eugénio Oliveira, sabendo que o Presidente da Assembleia-Geral da mesma Associação é um curioso pela obra pedagógica de Bernardino Machado, resolveu convidá-lo para apresentar a mesma Associação, fazendo-o com gosto, esperando que a respectiva comunicação seja proveitosa para o auditório que estiver presente, e cuja sessão será na Bilioteca Municipal de Barcelos. Não só apresento aqui alguns livros que vou usar nessa mesma comunicação, como igualmente a dedico ao Exno Sr. Dr.º Manuel Sá Marques, neto de Bernardino Machado, pela admiração, cordialidade, respeito e amizade fraternal com que sempre me tem dedicado a sua atenção. O que vou colocar é a parte incial da mesma comunicação.





Começo, precisamente, por tentar estabelecer o propósito da minha comunicação, a qual se situará em duas partes, as quais não se diferenciam, mas que se interligam entre si. Se, por um lado, pretendo estabelecer a relação dos três princípios republicanos, a saber, Liberdade, Ordem e Trabalho, pelo menos naquilo que o ideário republicano representava no seu marketing político, veremos o quanto estes três princípios estão entre si ligados numa base edificante perante a educação, a instrução e, no seu corolário, a ética; e, por outro lado, tais princípios serão vivenciados na obra pedagógica de Bernardino Machado, tipificando não só uma Filosofia da Educação (aqui retomando nas palavras de Rogério Fernandes), como igualmente o seu sentido prático, o sentido de uma Filosofia Prática. Esta Filosofia Prática e/ou educação prática tentarei evocá-las perante as "Notas Dum Pai".





Refiro, para começar, um diálogo de Socrates com Teeteto. Socrates: «E quem tem uma ideia, não deverá ter uma ideia de alguma coisa?» Teeteto: «Necessariamente». Socrates: «E quem tem uma ideia de alguma coisa, não terá de ser algo real?» Teeteto: «Parece que sim.» Este simples diálogo serve para mostrar que, há mais de dois séculos, a realidade e a verdade intrínseca das coisas, ou melhor, que a verdade se encontra na realidade, foi sempre um fenómeno presente no pensamento. O que aqui temos vai ao contrário de alguns filósofos que atriuíram simplesmente ao iluminismo a reconversão da verdade revelada ao ser humano na sua própria realidade, uma verdade que não se transcende, mas que está na interioridade da pessoa que se encontra na razão, a tal maturidade kantiana. E, se, por seu turno, ao longo do século XIX surge-nos a conversão de um possível mundo sem Deus com Feurbach (o homem cria Deus em si próprio), Hegel (o conhecimento de Deus chega por via do homem), Marx (a religião não faz o homem, mas, ao contrário, é o homem que faz a religião), o niilismo de Nietzche e a transformação de todos os valores, em Darwin (no qual encontramos o factor temporal e a diversidade dos cntextos físico-morais em que os seres vivos se inter-relacionam, contribuindo para a formação das suas características, e o mesmo acontecendo como ser humano), em Wallace (o qual, ao contrário de Darwin, as capacidades mentais não podem ser explicadas pela selecção natural), a vontade de Schopenhauer, e, finalmentem o caso de Comte com os seus três estádios (teológico, metafísico e positivo), edifificando a veneração da Humanidade, servem tais referências para exemplificar que elas, directa ou indirectamentem as encontramos em Bernardino Machado, reformulando e adaptando essas ideias naquilo que irei designar por uma ética social compartilhada, nas sua spalavras de cooperação, , direcccionada para o bem comum, sem a referência teológica.







Este será o ideal republicano centrado na ideia de um ontologismo para a cidadania, o qual é muito bem explícito num filósofo contemporâneo, Daniel Innerarity, e uma ideia chave para Bernardino Machado, constantemente e principalmente nas "Notas Dum Pai", apesar de, em alguns momentos, não simpatizar ainda com os republicanos, questionando o tipo de opinião pública, entenda-de, cidadania, estarão a criar para o país, mas, por outro lado, afirma-se socialista e é, desde sempre, contra qualquer tipo de ditadura, tal como, e , neste sentido, já se tinha apelidado de liberal progressista. E, diga-se, que toda a reformulação teórica de uma possível sociedade sem Deus. vai ter o seu corolário com o laicismo republicano, a tal ética laica,, com a Lei da Separação da Igreja e do Estado, na pretensão de remeter o religioso ao privado. Mas para alcançar o edifício da ética social, Bernardino Machado percorre um longo caminho teórico e, ao mesmo tempo, prático, estando na base dessa ética social a instrução e a educação, conceitos que ele muito bem distinguia, ao contrário dos pedagogos convencionais e institucionais de hoje.