domingo, 29 de agosto de 2010

pascal, rohmer e a beleza

Nascemos com um carácter de amor nos nossos corações, que se desenvolve à media que o espírito se aperfeiçoa, e que nos leva a amar o que nos parece belo sem que jamais nos tenham dito o que isso é. Quem poderá duvidar assim de não estarmos no mundo para outra coisa que não amar? Com efeito, bem podemos esconder-nos de nós mesmos, amamos sempre. Nas próprias coisas das quais parece ter-se separado o amor, este lá está secretamente e dissimulando-se; e não é possível que o homem possa viver um momento sem o ter. / O homem não gosta de morar consigo; e contudo ama: tem necessidade pois de noutra parte buscar o que amar. Só pode encontrá-lo na beleza; mas como é ele mesmo a mais bela criatura que Deus alguma vez formou, é-lhe necessário encontrar em si mesmo o modelo dessa beleza que procura lá fora. Cada qual pode dar em si mesmo conta dos seus primeiros raios; e segundo nos apercebemos de que aquilo que está no exterior convém ou se afasta dela, formamos as ideias de belo e de feio sobre todas as coisas. (15-16)

Pascal


Fala-se do Amor e da Beleza. Ambas têm opiniões diferentes opostas acerca dessa questão. Aurélia afirma que se ama alguém porque se acha que é belo. Jenny afirma que se acha belo porque se ama. Adrien está mais de acordo com esta opinião.
- Um homem pode ser muito feio e ter um encanto infinito. Quem o ama, transforma automaticamente a sua fealdade em beleza.
- Eu - diz Aurélia -, se acho que alguém é feio, não tem qualquer encanto. Já nada mais é possível. Acaba imediatmente.
- Acaba o quê? - pergunta Jenny.
- Seja o que for! Mesmo relações muito artificiais. Mesmo só para beber um copo e passar cinco minutos com ele. Não posso; se é feio, desapareço... Você pode ter relações de amizade com alguém que acha feio?
- Mas a fealdade e a beleza não intervêm na minha amizade. Se sinto amizade por alguém, esse alguém, para mim, não é bonito nem feio.
- Não se cria uma amizade em cinco minutos. Temos de voltar a ver-nos por várias vezes. Como pode voltar a ver por várias vezes uma pessoa que acha feia? Eu fujo logo. Não é possível!
- Não se trata de fealdade. Na multidão de pessoas que são belas, só me interesso por aquelas que têm qualquer coisa para além da sua beleza. SE encontrasse alguém de uma beleza absoluta, ficaria aborrecida.
- Quando digo belo, não falo da beleza grega. A beleza absoluta não existe. Para se achar que alguém é belo, basta por vezes um pormenor: qualquer coisa entre o nariz e a boca pode ser o suficiente.
- Portanto - diz Adrien -, toda a gente tem uma hipótese de te agradar.
- Não!
- Uma hipótese, ao menos.
- Ah, não! O drama é esse. Encontro muito poucas pessoas belas. Isso limita-me incrivelmente nas minhas relações, porque, quando as pessoas me repugnam, deixo de conviver com elas. (129-130)
Rohmer

fisico republicano