sábado, 6 de março de 2010

(RE) CRIAR PORTUGAL




"nada há de novo dabaixo do sol." (Eclesiastes)


Tomo como princípio argumentativo das Conferências do Casino, o qual pretendia, acima de tudo, a renovação da sociedade portuguesa pela seguinte estratégia, recorrendo, para tal, de uma carta de Antero a Teófilo. Osa paradigmas anterianos anunciados são a racionalidade, a humanização positiva das questões morais, a ética da simpatia face aos mitos teologais, os princípios democráticos na esfera política, a proclamação de uma ética do trabalho, o fim social e regenerador da arte e da literatura para combater o egoísmo e o individualismo (contudo, alguns deles, caso de Eça, alterariam o rumo social da arte para a metafísica da inteorioridade na literatura, caso de Jacinto da "Cidade e as Serras" e com Fradique Mendes). Tais eram as medidas com que a Geração de 70 pretendia para a renovação mental da sociedade portuguesa em decadência latente face à Europa, esta encarnada como ficção e realidade no Portugal de então, e de novo reencarnada como mito na contemporaneidade. Contudo, a Geração de 70 propugnou uma ética de convergência, cuja regenaração da sociedade portuguesa uma ética de identidade, evocando Guerra Junqueiro "um mundo novo que há-de vir", o qual irá aparecer "não pela cifra dos economistas, não pelas revoltas da anarquia, mas sim pelos heróis e pelos santos dessa nova e soberana igreja universal". Este idealismo utópico junqueiriano, cuja regenração da sociedade portuguesa se realiza pela redenção da dor, isto é, no fundo, por uma ética epicuriana, acaba por ser esse essa identidade unificadora que não se ressalva no Portugal de hoje, mantendo-se no mesmo individualismo e egoísmo dos tempos da Geração de 70. Aliás, Junqueiro, ele próprio, será a mitificação, no futuro, da ética laica republicana, convertido no profeta da revolução, conforme se pode ver na "Ilustração Portuguesa" de 1910. Antero já tinha sido mitificado em "santo"! Não deixa de ser, portanto, curiosa esta ética identificadora à volta do "grande homem" (Antero queixa-se da falta de um "homem superior"), na significação hegeliana e comteana, ou então no reflexo do herói de Carlyle, ou então no homem representativo de Emerson. Acima de tudo, o super-homem nietzschiniano, tão bem demarcado hoje na sociedade perante a ética meritocrática! Este ideal de convergência para o enaltecimento pátrio irá ter os seus efeitos no espírito comemorativo nos finais do século XIX, no qual a história assume uma ontologia societária, em termos de instrução e de educação. isto mesmo se pode ver na organização do Partido Republicano nas estruturas locais, para o desenvolvimento da ética cívica. Tal projecto será destronado pela nova história, na qual, de incidência marxista, irá evidenciar a interioridade do humano em toda a sua complexidade, perante o meio onde se desenvolve, até porque a História não é a dos grandes homens. Termino esta breve reflexão perante a citação em epígrafe: se Antero proclama a ideia de decadência (na literatura, na filosofia e até na ciência), hoje evidenciaria, perante os avanços tecnológicos ( e da aliança com que o poder realiza entre ideologia e tecnologia), que o ser humano se esquece de si mesmo, na terminologia heideggeriana da sua casa, que possivelmente não há literatura...

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