António Marujo - "A Bíblia, a arte do pecado original e a culpa". In Público/P2 (24 Out. 09), p. 4.
"A Bíblia é um manual de maus costumes". "É preciso ter muito cuidado quando se lê a Bíblia". In Jornal de Notícias (19 Out. 09), pp. 4-5.
O mito de Caím é o mito da indiferença do ser humano pelo ser humano.
O Livro dos Saberes Práticos
A história acabou, não haverá mais nada que contar.
José Saramago
A História, as histórias do humano, não acaba(m).
O Livro dos Saberes Práticos
Richard Zimmler - "Saramago e a insustentável leveza da ignorãncia". In Público/P2 (27 Out. 09), pp. 6-7.
i.
Este mito poderia ter constituído um belo exemplo de brandura divina. Ora o nosso imaginário conservou de Caim uma imagem negativa, se não atroz. Impõe-se então uma série de perguntas:
- Por que seria necessário existir um assassínio nas origens da humanidade - e que ainda por cima é um fratricídio?
- Por que seria necessário haver, por um lado, um filho amado por Deus a morrer sem descendência e outro que, apesar de ser um assassino, escapa ao castigo e deixa atrás de si fundadores de linhagens prestigiadas e «socialmente úteis»?
- Por que será que Adão e Eva decidem - de acordo com o texto que se apresenta como fundador conceber um terceiro filho que vão reconhecer como sendo o único legítimo?
- Por que será que a divindade escolheu arbitrariamente entre o agricultor e o pastor, privilegiando o último a ponto de fazer que Caim passasse pelo suplício da inveja?
ii.
Surgem-nos duas vias de investigação: por um lado, apresentamos o Mal como fundador. Após o episódio em que Adão e Eva se opõem à personagem divina por intermédio do tentador, após este fantasma de um paraíso concedido e perdido em favor de um saber entre a morte e sobre a sexualidade (acontecimento que os Gentios traduziram em termos de pecado original) o texto bíblico propõe-nos além disso uma reflexão que, desta vez, não se vai referir à queda, mas a um assassínio que parece ter sido necessário para introduzir a humanidade na socialidade. isto significa que a harmonia não poderia caracterizar o sujeito, mas que são sobretudo as tensões, as lutas e, no caso, a violência que introduzem as categorias da dívoda e da culpabilidade no próprio local em que o sujeito se estrutura.
iii.
... verdade dupla que o mito de Caim revela: o assassínio (só) foi cometido uma (única) vez, por isso está sempre presente no horizonte do nosso entendimento, da nossa história e até dos nossos processos de subjectivação e, logo, não precisa de ser realmente repetido. Mas a nossa posição enquanto indivíduos exige que esta constatação, que ameaça uma certa forma de humanismo pintado de angelismo beato, seja combinada com um reconhecimento deste crime, sem o qual reinaria a repetição estetizante e infinita do assassínio como maneira de estar no mundo.
iv.
... a negação do assassínio do outro resulta na negação da sua própria existência, primeiro na sua subjectividade, depois na sua humanidade e por fim na sua existência.
v.
Esta preversão da cultura e da civilização, esta recusa em reconhecer o crime estão na base de uma negação que está constantemente a encenar, em nome das massas, em nome do culto do eu, a parte maldita de Caim, atormentada por um outro que ele não consegue reconhecer «como seu irmão» e do qual também não se consegue livrar. Ora, já vimos que foi precisamente porque Caim reconheceu o seu erro, e apenas depois de uma sentença o ter castigado pelo seu crime, que os descendentes puderam fundar as formas de uma sociedade da qual todos nascemos.
Jacques Hassoun
António Marujo - "Saramago assume "valores cristãos" e diz que há muita coisa na Bíblia que vale a pena ler". In Público (22 Out. 09), p. 6.
Luís Afonso - "Bartoon". In Público (22 Out. 09), p. 39.
Luís Miguel Queirós, Natália Faria - "Saramago volta a provocar a ira da igreja". In Público (20 Out. 09), p. 4.
Rafael Barbosa - "Figura do dia. É feio fazer publicidade a livros?" In Jornal de Notícias (22 Out. 09) p. 6.
"Entrevista ao autor de Caim. O valor do ser humano". In Jornal de Letras, Artes e Ideias (21 Out. 09), pp. 18-19.
"José Saramago cara a cara com um padre e teólogo". In Expresso (24 Out. 09), pp. 20-21.
Miguel Sousa Tavares - "O Futuro das Palavras. "Deus não é de fiar", José Saramago. "Quem é esse Saramago?", Deus". In Expresso (24 Out. 09), p. 9.
"José Saramago cara a cara com um padre e teólogo". In Expresso (24 Out. 09), pp. 20-21.
António Guerreiro - "Livros. Ficção. Em Nome de Deus". In Expresso/Actual (24 Out. 09), p. 34.
António Pedro Pereira - "Saramago "um bocado ofensivo" para os islâmicos de Lisboa". In Diário de Notícias (23 Out. 09), p. 64.
Eugénio Lisboa - "Literatura como manual de maus costumes". In Diário de Notícias (23 Out. 09), p. 13.
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