terça-feira, 22 de setembro de 2009

os monárquicos famalicenses e bernardino machado



"Novo Presidente". In A Gazeta de Famalicão. V. N. de Famalicão, Ano 2, n.º 63 (9 Out. 1915), p. 1.


Está o sr. dr. Bernardino Machado investido na Chefia do Estado. / Isso não nos supreende, como de resto não supreender ninguém. / Era de esperar que S. Ex.ª visse, afinal, satisfeitas as suas aspirações de sempre, e só admira que o sr. dr. Manuel de Arriaga tivesse subido primeiro do que ele à Suprema Magistratura do país, quando a S. Ex.ª chamavam já El-Presidente in ello tempore, naqueles tempos felizes de propaganda, porque tantos republicanos suspiram já, e em que os apóstolos tratavam de construir a torre de bogalhos das suas fantasias, que o sopro da realidade tão depressa lançou por terra e pôs em farrapos. / E melhor seria para o sr. dr. Bernardino que a sua vez não tivesse ainda chegado. Bem preferível lhe seria continuar a viver de ilusões, do que ter de conhecer as dificuldades do lugar, os espinhos da missão. / Por en quanto tudo são festas, os acordes suaves da Portuguesa a embalá-lo num sonho de quimeras; o fogo, as iluminações, os cumprimentos, os abraços, as chapeladas, os sorrisos e as felicitações que surgem de todo o lado; as palmas, os vivas e as aclamações; o brilho dos cristais, o espumar do champagne e o entusiasmo dos brindes nos banquetes, todas essas homenagens de que tem sido alvo, em que haveria certamente muita sinceridade mas a que não faltamrem também muito beijos de judas, muita hipocrisia, , dando-lhe certamente a impressão, neste momento, de que tudo caminha num mar de rosas, que a sua felicidade e a do país, a paz, a ordem e a tranquilidade, o equilíbrio das finanças e o progresso nacional, está tudo ali fechadinho na palma da sua mão. / Já sucedeu o mesmo com o sr. dr. Manuel de Arriaga, que recebeu as mesmas provas de consideração e respeito, os mesmos protestos de sujeição e obediência, quando subiu. E o resultado viu-se. A breve trecho as flores da festa tinham murchado e os espinhos principiaram a surgir, vivos como punhais, rasgando o coração do pobre velho, que esgotados todos os meiosmde conciliação, amargurado e desiludido, teve de renunciar, por entre o desprezo e as ingratidões dos mesmos que o tinham aclamado. /Por enquanto vem vai o novo Chefe do Estado. São tudo ovos da Páscoa. Estão, por asim dizer, nos primeiros dias da lua de mel. / O pior é o reverso da medalha quando as desilusões vierem, as flores murcharem e os espinhos surgirem, as desinteligências partidárias romperem de novo e a desarmonia social voltar a manifestar-se. / O povo, aquele povo que cerca o novo Presidente, e que há-de ser o que mais lhe há-de aguar a sua gerência, assemelha-se aos criados de servir. A princípio fazem todas as vontadinhas dos amos, obedecem-lhes cegamente, não há ordem que não cumpram alegres, desejos que não satisfaçam de sorriso nos lábios. Mas, a confiança vem, o respeito desaparece, e às duas por três principiam os criados a falar mais alto do que os amos, a contrariá-los, a desgostá-los, a indispô-los, e quem até aí se julgava senhor passa muitas vezes a ser escravo da vontade dos outros, até que a paciência se esgota e se põe termo a semelhante situação. / E lá se perdem, lá se vão por a´gua abaixo os melhores propósitos, os mais patrióticos desejos de acertar. / O sr. dr. Bernardino Machado pode ser um espírito conciliador, com a maior vontade de modificar a situação da República. Há-de sucumbir, como sucedeu ao sr. dr- Manuel de Arriaga, certamente animado dos mesmos propósitos e revestido das mesmas qualidades. / A educação do povo rfepublicano não é hoje melhor do que há quatro anos. Antes pelo contrário. Por isso, quanto mais baixo lhes falar e mais manso se lhes mostrar o sr. dr. Bernardino Machado, mais eles lhe falarão e mais arrogantes os terá ver.




"Novo Presidente". In Gazeta de Famalicão. V. N. de Famalicão, Ano 2, n.º 54 (7 Ago. 1915), p. 1.


Está eleito o novo Chefe de Estado. Entre todos os que se propunham ao sufrágio venceu o sr. dr. Bernardino Machado, que já vinha fazendo tirocínio para o lugar desde os tempos da monarquia. / Para nós, a quem o facto nada interessa, pouco importa que tivesse saído eleito Pedro ou Paulo, Sancho ou Martinho, e nem sequer registaríamos o resultado se o caso se nos não prestasse à maravilha para sobre ele bordarmos ligeiras consideraçoes. / Não iremos na corrente dos que despejam sobre o novo Presidente toda a casta de insultos, vendo na sua escolha um perigo para a Pátria, como se o Chefe do Estado, que preside mas não governa, pudesse influir ou modificar a situação política, concorrer para que a República, arripiando caminho, deixasse o beco sem saída em que se meteu, para entrar na estrada larga do Direito e da Justiça de que se desviou logo ao nascer, como criança que, perdida num deserto, se vê cercada de feras que acabam por a devorar. O povo, numa daquelas sentenças que a lição dos tempos lhe ensinoi, como dizer. como máxima infalível, que quem torto nasce tarde a mal se endireita. / Não salientaremos também a incoerência dos que, não gostando do sr. dr. Bernardino, ajudaram, no entanto, a elegê-lo com o seu voto, só porque essa era a vontade do sr. Afonso Costa, tornado cacique política numa eleição que afinal já nasce com os mesmo defeitos que têm desmoralizado o sistema constitucional, que seria realmente o melhor se os homens o não estragassem. Quando oe xemplo vem assim do alto, aparecendo vontades que se impõem, opiniões que se fazem respeitar e homens que para não desobedecerem às ordens dos chefes, para cumprirem os desejos ou os caprichos dos seus senhores, calcam os ditames das sua consciência e vão votar no candidato que mais prjudicial acham aos interessas da nação; quando para a eleição de Chefe de Estado, em que só têm votado os grandes da política. se procede desta maneira, nós queremos que nos digam que juízo podem fazer de tudo isto os pequenos, os que, pelas suas condições de vida ou pela sua pouca cultura não podem ou não sabem firmar a sua opinião, e se eles amanhã não têm razão para se deixarem ir com quem mais lhes der ou prometer. / E nós podíamos perguntar aqui ao senador local, sr. Sousa Fernandes, se o homem que agora ajudou com o seu voto a elevar à suprema magistratura do país, não será o mesmo que há um ano, o máximo, o fez quebrar a pena com que vinha defendendo a República para se refugiar ferido e amado ma sua quinta de Mões. / Mas o resultado da eleição, bom ou mau - os republicanos que o digam - não nos interessa, co mo não interessa ao país. / Quando muito, pode ser uma festa de família, se não for antes um motivo de novas cisões, de mais lutas, talvez de novas revoluções. / Para os interesses da Pátria, para a paz interna, para a consolidação da República, tanto vale a cordealidade do sr. dr. Bernardino, como valeria o génio de Guerra Junqueiro, a diplomacia de Duarte Leite, a aristocracia de Braamcamp Freire ou a democracia de Correia Barreto. / Se levar até ao fim o seu mandato, não lhe sucedendo como ao sr. Arriaga que o não pode concluir, ao abandonar o lugar há-de reparar que deixa tudo como dantes, ou mais baralhado do que dantes, em política, como em finanças, em ordem como em administração. / Ora, sendo assim, como é, traduzindo a eleição a vontade do país, mas os desejos do sr. Afonso Costa, e não podendo o chefe de Estado influir na vida política e financeira do país, sempre queríamos que nos dissessem onde está a vantagem de termos um Presidente em vez dum Rei. As desvantagenshá-de mostrá-las esta eleição.



"Retalhos. O Mais Ilustre Filho de Famalicão". In Gazeta de Famalicão. V. N. de Famalicão, Ano 2, n.º 64 (16 Out. 1915), p. 1


Era assim que a Câmara chamava ao sr. dr. Bernardino Machado, nos convites que fez distribuir para a manifestação de segunda-feira. / Quanto a ilustre, que não é propriamente a mesma coisa que ilustrado, não foi ainda ressalvado aquele problema que «À Nação» propôs sobre a linhagem de S. Ex.ª, nbem nos parece que um regime democrático deve preocupar-se com o sangue azul dos seus chefes: quanto a ser filho desta terra, lembramos à Câmara que S. Ex.ª é tanto nosso conterrâneo como o seu presidente, pois segundo documentos autênticos que os próprios jornais republicanos têm trasladado, o chefe do Estado de Portugal nasceu no Rio de Janeiro em 28 de Março de 1851 e, quando já aluno da Universidade de Coimbra, ainda S. Ex.ª se considerava carioca, tendo nessa qualidade, assinado uma mensagem de congratulação que os estudantes brasileiros a entregavam ao monarca do seu país, quando D. pedro II visitou Coimbra. / A não ser que a Câmara queira concluir como a «Estrela do Minho» que S. Ex.ª é nosso conterrâneo porque passou a sua mocidade em Famalicão./ De maneira que o director da «Estrela», que veio também em rapaz para Famalicão, deixou por esse facto de ser natural de Vilar de [Macada] para passar a ser nosso conterrâneo também! / E ele fala como se realmente o fosse... Ele o o sr. presidente da Câmara...


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